domingo, 31 de julho de 2011

mihi suspirium









Acendi um cigarro
só de pirraça
porque sou contra extremismos
e porque eu precisava suspirar diferente...
"O cigarro é uma maneira disfarçada de suspirar" (Mário Quintana)

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Sorte







Ontem, sem perceber, prendi dois trevos do meu vasinho na gaveta do arquivo. Quando vi o que fiz senti um aperto de tristeza. E trevo lá sente dor? Mas senti pena mesmo assim. Soltei os trevinhos, mas não tive coragem de arrancá-los do vaso.
Hoje fui dar uma olhadinha neles e eles des-murcharam... Que bom! Nunca que eu poderia maltratar a sorte... Meus trevinhos entenderam!!!
; )


sexta-feira, 15 de julho de 2011

O Cisco - Manoel de Barros



(Tem vez que a natureza ataca o cisco para o bem.)
Principais elementos do cisco são: gravetos, areia,
cabelos, pregos, trapos, ramos secos, asas de mosca,
grampos, cuspe de aves, etc.
Há outros componentes do cisco, porém de menos
importância.
Depois de completo, o cisco se ajunta, com certa
humildade, em beiras de ralos, em raiz de parede,
Ou, depois das enxurradas, em alguma depressão de
terreno.
Mesmo bem rejuntado o cisco produz volumes quase
sempre modestos.
O cisco é infenso a fulgurâncias.
Depois de assentado em lugar próprio, o cisco
produz material de construção para ninhos de
passarinhos.
Ali os pássaros vão buscar raminhos secos, trapos,
asas de mosca
Para a feitura de seus ninhos.
O cisco há de ser sempre aglomerado que se iguala
a restos.
Que se iguala a restos a fim de obter a contemplação
dos poetas.
Aliás, Lacan entregava aos poetas a tarefa de
contemplação dos restos.
E Barthes completava: Contemplar restos é
narcisismo.
Ai de nós!
Porque Narciso é a pátria dos poetas.
Um dia pode ser que o lírio nascido nos monturos
empreste qualidade de beleza ao cisco.
Tudo pode ser.
Até sei de pessoas que propendem a cisco mais do
que a seres humanos.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Quando vou p'ra dar batalha, convido meu coração



Uma palavra vai nos levando a outras palavras, a outros enunciados, a outros lugares. As palavras são assim. Algumas vezes elas nos levam mesmo é para lugar nenhum. Ou então, na maioria das vezes, para o lugar-comum da rotina, do mesmo e do já sabido. Mas essas mesmas palavras - e isto é impressionante - também têm o poder de fazer desvios e nos fazer chegar a paragens desconhecidas e formidáveis.

Quando desconfio que elas estão me desviando para novas paragens, já sei que demorarei a voltar. Foi justamente o que me aconteceu depois de ler o verso:

"Quando vou p'ra dar batalha, convido meu coração"

Esse verso não me chegou por conta de um acaso espantoso. Na verdade, eu busquei por ele. E o encontrei numa dessas aventuras labirínticas do google em busca de nomes e palavras. Ele está presente na obra Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa, na Canção de Siruiz:


urubu é vila alta
mais idosa do sertão
padroeira minha vida
vim de lá, volto mais não

corro os dias nesses verdes
meu boi mocho baetão
buriti, água azulada
carnaúba, sal do chão

remanso de rio largo
viola da solidão
quando vou p'ra dar batalha
convido meu coração


Quando descobri que este era o meu verso, meu dia parou. E como se não bastasse ainda achei uma adaptação e interpretação de Antonio Candido para a canção, que me deixou emocionada. Não consigo parar de ouvi-la...

Para quem quiser correr o risco de se encantar, como eu, é só acessar o endereço abaixo:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u416656.shtml

Tudo isso para dizer que encontrei as palavras que eu queria, que elas me levaram a um lugar inesperado, que vou guardá-las no coração e que lembrarei delas durante as batalhas difíceis.

Mas não era para mim que eu queria essas palavras. Elas eram para eu realizar um ritual que inventei (para desejar que tudo dê certo!) sem rezar para os santos. É que em rezar eu não acredito, mesmo achando tão bonito.

Eu sei que os homens e os santos não deixarão de ver nesse ritual (meio esquisito?) uma forma de rezar. Eles podem, talvez, ver graça na "escolha" de dois nomes da literatura brasileira como os seus porta-vozes para os meus votos. Mas eu também sei que Guimarães Rosa e Antonio Candido não poderiam ser padrinhos melhores neste caso para - através das palavras de um, da voz de outro e da importância de ambos em nossa história - levar o meu desejo de boa sorte aonde ele deve ir.