segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Ainda sobre viajar...


"O outro traça, indefinidamente, a injunção de passar: como na ordem escrita, de uma só linha, mas sem fim: vai, segue em frente, este não é teu país, nem aquele tampouco - imperativo do desapego que obriga a pagar o preço de um abstrato domínio ocular do espaço deixando todo lugar próprio, perdendo o pé. A vidraça e a linha férrea repartem de um lado a anterioridade do viajante, narrador putativo e, do outro, a força de sê-lo, constituindo em objeto sem discursos, poder de um silêncio exterior. Mas, paradoxo, é o silêncio dessas coisas colocadas à distância, por trás da vidraça que, de longe, faz as nossas memórias falarem ou tira da sombra os sonhos de nossos segredos. O isolador produz pensamentos com separações. A vidraça e o aço criam especulativos ou gnósticos. É necessário esse corte, para que nasçam, fora dessas coisas mas não sem elas, as paisagens desconhecidas e as estranhas fábulas de nossas histórias anteriores." 

 Michel de Certeau

terça-feira, 7 de novembro de 2017

A vó Adelaide


Maria Adelaide de Jesus Alves. Minha vó Adelaide. Nascida em Lisboa em 1927, a vó atravessou o Atlântico em 1950 para uma nova vida no Brasil. Veio de navio, ela e seus dois filhos ainda bem pequenos. Ela tinha apenas 23 anos de idade quando fez essa viagem com os filhos. Meu vô Soares, então marido da vó, já tinha vindo antes. Quanta vida, quantas histórias a vó trazia da sua terrinha para cá? Que novas aventuras a aguardavam nesse país desconhecido? Que venturas e desventuras? Quantos sonhos, decepções, alegrias, realizações? A vó teve mais dois filhos no Brasil. Aqui a vó criou os seus filhos. E trabalhou. Cozinhou, costurou, bordou, leu, morou em várias cidades, viajou... No levar da sua vida, a vó deve ter dado tanta risada! E deve ter chorado muito. E brigado também... acho que sim... E, sim, avó deve ter amado... muito. Aqui no Brasil a vó e o vô se separaram. Também aqui a vó passou pela dor de perder um segundo filho. Para suportar o que não havia sido aprendido, o que não estava previsto, para suportar o inominável, o impossível, a vó precisou então viver de outros jeitos. E conseguiu. Seguindo em frente, a vó deve ter continuado a rir sim, e a chorar também, deve ter continuado a brigar, ainda bem... e a amar. 

“Que pode uma criatura senão, 
Entre criaturas, amar? 
Amar e esquecer, amar e malamar, 
Amar, desamar, amar? 
Sempre, e até de olhos vidrados, amar?” 

A vó teve muitos netos e bisnetos. Como eu me sentia orgulhosa de ser netinha dela! Ela era moderna, elegante, usava um lenço colorido no cabelo e uns óculos escuros enormes. Era tão falante! A vó lia, trabalhava, estudava, viajava, cozinhava, costurava, bordava, jogava buraco e adorava resolver equações de matemática... A vó escrevia cartinhas para mim e para a família para desejar felizes aniversários... Mas, mais do que escrever, acho que o que ela mais gostava era de contar histórias das coisas que fazia. A vó tinha um jeito tão envolvente de narrar qualquer coisa que até história ruim virava história boa. Na verdade, graças à lábia da vó, comecei a desconfiar da minha “perspicácia” avaliativa que dividia o mundo em coisas de “bom” ou de “mau” gosto, e a me perguntar se haveria mesmo histórias ruins. Quem já teve a oportunidade de ouvir a vó contando o que acontecia na novela Maria do Bairro ou no livro Cinquenta tons de cinza deve ter tido uma experiência bastante semelhante. A vó sempre foi muito atenta. Muitas vezes, essa atenção era do tipo silenciosa, que observada tudo ao redor, sem precisar falar nada, sem querer falar nada. Quieta. Por dentro, tempestade. Perspicaz, a vó fazia o que lhe convinha com as coisas que podia ter em mãos e, assim, acho que pôde ir transformando vazios em coisas que faziam sentido para ela. A vó soube continuar, soube transformar o que estava ao seu redor e soube se transformar. A vó viveu. Tanto! E passou tão rápido... Que vida! Um segundo de eternidades... 

“Que pode, pergunto, o ser amoroso, 
Sozinho, em rotação universal, senão 
Rodar também, e amar? 
Amar o que o mar traz à praia, 
O que ele sepulta, e o que, na brisa marinha, 
É sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia? 
Amar solenemente as palmas do deserto, 
O que é entrega ou adoração expectante, 
E amar o inóspito, o áspero, 
Um vaso sem flor, um chão de ferro, 
E o peito inerte, e a rua vista em sonho, 
E uma ave de rapina. 
Este o nosso destino: 
Amor sem conta, 
Distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas, 
Doação ilimitada a uma completa ingratidão, 
E na concha vazia do amor à procura medrosa, 
Paciente, de mais e mais amor. 
Amar a nossa falta mesma de amor, 
E na secura nossa, amar a água implícita, 
E o beijo tácito, e a sede infinita”


segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Waiting, waiting, waiting, waiting


O que a gente faz quando uma música não sai da cabeça? Escuta ela repetidamente, repetidamente, repetidamente, até cansar... o.O
Waiting for the sun
Waiting for the sun
Waiting for the sun
Waiting for the sun
This is the strangest life I've ever known


 

sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

***


As Subterrâneas (Olga Savary)

Mais belas que estas flores
- mas muito mais - que florescem
atormentando mil verdes,
mais belas que estas vermelhas
incendiando o jardim,
onde mãos imprecisas
castigam querendo colher,
são as nunca nascidas,
são essas flores ocultas
em subterrâneo desejo.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

Terra, semente, corpo

Mexendo com a terra para construir um jardim e uma horta, acabei mexendo comigo também. Acho que foram as sementes de lavanda jogadas na terra que me levaram a divagar. Esta palavra: Lavanda! Que linda...! É uma palavra azul, roxa, rosa... lavanda. É palavra que muda de cor porque a lavanda parece variar de espectro nos diferentes horários das luzes do dia. Minhas sementes ainda têm uma cor muito pequenininha e se perdem na terra, ainda são cor de terra. Depois vão brotar, crescer e se transformar em outras cores.
As sementes na terra, as mãos na terra, o cio da terra, a terra.
Quando eu estiver morta, irei para dentro da terra e o meu corpo vai se decompor, vai se desmanchar e vai virar terra também. Nunca consegui pensar muito tempo sobre o meu corpo morto enterrado... Sempre foi assustador. Mas esta terra não é assustadora. Esta terra, que está nas minhas mãos, vivas, não é assustadora. É terra viva, cheia de pedaços de folha, casca, bichinhos, húmus... É preta, fofa, leve, cheirosa. Seria reconfortante o meu corpo dentro desta terra. As pessoas que trabalham com a terra, que vivem da terra, que sentem amor pela terra, talvez pensem assim também. Será?

Todos esses pensamentos, muitos breves, ligeiros de medo para permanecerem leves... não quero pensar muito nisso... esses pensamentos ficaram.


domingo, 3 de julho de 2016

Questão de pontuação



Todo mundo aceita que ao homem cabe pontuar a própria vida: que viva em ponto de exclamação, se tiver a alma dionisíaca. Que viva em ponto de interrogação, em caso de filosofia ou de poesia. E que viva equilibrando-se entre vírgulas e sem pontuação (na política!). O homem só não aceita do homem que use a pontuação fatal: que use, na frase em que vive, o inevitável ponto final.

João Cabral de Melo Neto por Abu

L'ardeur



Rire ou pleurer, mais que le coeur 
Soit plein de parfums comme un vase, 
Et contienne jusqu’à l’extase 
La force vive ou la langueur. 
Avoir la douleur ou la joie, 
Pourvu que le coeur soit profond 
Comme un arbre où des ailes font
Trembler le feuillage qui ploie ; 
S’en aller pensant ou rêvant, 
Mais que le coeur donne sa sève 
Et que l’âme chante et se lève 
Comme une vague dans le vent.
 Que le coeur s’éclaire ou se voile, 
Qu’il soit sombre ou vif tour à tour, 
Mais que son ombre et que son jour 
Aient le soleil ou les étoiles… 

Anna de Noailles, Le coeur innombrable

segunda-feira, 30 de maio de 2016

Hay que moverse en manada


Essa foto foi tirada pela artista Flora Negri na Marcha das Vadias de Recife. Ela registra a força feminina, a luta, a garra e a nossa potência.
"Hay que moverse en manada. Una mujer sola es una mujer; dos, un par de locas; tres, una tormenta; más de tres, el miedo en los ojos del lobo asustado." Helena Torres


sexta-feira, 13 de maio de 2016

silêncio ensurdecedor




"Você não escuta esse grito horrendo ao redor e a que chamam silêncio?"


terça-feira, 12 de abril de 2016

Pós-concurso




Fiz tanto esforço para não chorar, não chorar, não chorar! - eu não podia chorar... não, não e não! de jeito nenhum..! - que agora o choro vem vindo de pouquinho... desengasgando o coração apertado e deixando a vida se espalhar... a vida, esse punhado de areia que escorre pela mão... a alegria, a paz... Obrigada! Eu consegui! Eu consegui... Obrigada!


quarta-feira, 6 de abril de 2016

A canção que me deu forças na manhã do dia 6




Caçada - Chico Buarque 1973

Não conheço seu nome ou paradeiro
Adivinho seu rastro e cheiro
Vou armado de dentes e coragem
Vou morder sua carne selvagem
Varo a noite sem cochilar, aflito
Amanheço imitando o seu grito
Me aproximo rondando a sua toca
E ao me ver você me provoca
Você canta a sua agonia louca
Água me borbulha na boca
Minha presa rugindo sua raça
Pernas se debatendo e o seu fervor

Hoje é o dia da graça,
Hoje é o dia da caça e do caçador

Eu me espicho no espaço feito um gato
Nossos corpos rolando no mato
Nossos corpos a se embolar no mangue
Minhas garras abrindo o seu sangue
Eu gemendo enquanto você me abraça
Nossos corpos grudados de suor
Hoje é o dia da graça,
Hoje é o dia da caça e do caçador
De tocaia fico a espreitar a fera
Logo dou-lhe o bote certeiro
Já conheço seu dorso de gazela
Cavalo brabo montado em pelo
Dominante, não se desembaraça
Ofegante, é dona do seu senhor

Hoje é o dia da graça,
Hoje é o dia da caça e do caçador

domingo, 6 de março de 2016

Para continuar com coragem




Laissons Entrer Le Soleil
Let  the Sunshine In
Julien Clerc

On se guette,
Traqués, à bout de souffle
Marchant
Pétrifiés dans nos manteaux
D'hiver
Refoulés aux frontières du mensonge
Des nations qui crèvent.
Tués par des rêves chimériques
Écrasés de certitudes
Dans un monde glacé de solitude
Savoir
Si quelque part il y a
L'espoir
D'être un jour les enfants
Du hasard
Je vois ma vie projeter
Son futur dans l'espace
Et le silence me répond,
En secret (parlé)
Parker, j'ai l'impression de mourir.
Manchester England
Manchester England

Au bout de l'atlantique,
je suis un génie, génie
Et je crois en Dieu,
et je crois que Dieu
En Claude a foi
Et Claude,
c'est moi, c'est moi

On se guette,
Traqués, à bout de souffle
Marchant
Pétrifiés dans nos manteaux
D'hiver
Refoulés aux frontières du mensonge
Des nations qui crèvent.
Tués par des rêves chimériques
Écrasés de certitudes
Dans un monde glacé de solitude
Chantons
Nos rêves d'espoir sur un sitar
Sitar
De toi le roi est né
Et chantons
La vie qui est en nous et autour
De nous
Laissons, laissons, entrer le soleil
Laissons, laissons, entrer le soleil

Laissez, laissez entrer le soleil
Laissez, laissez entrer le soleil

Let the sun shine
Let the sun shine in
Let the sun shine in
Let the sun shine ....



segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Maria Bethânia - Rosa dos Ventos



... pois transbordando de flores
a calma dos lagos zangou-se
a rosa-dos-ventos danou-se
o leito dos rios fartou-se
e inundou de água doce a amargura do maaaaaar!
numa enchente amazônica!
numa explosão atlântica!
a multidão vendo em pânico!
a multidão vendo atônita!
ainda que tarde o seu despertar...

sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

Que delícia!



Que delícia! É o que desejo para este ano e para os próximos: estar em boa companhia nos caminhos e brincar nas poças d'água que aparecerem!

quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Piranguinho




Acho que me afeiçoei à Piranguinho. Adorei o nome: Piranguinho; a cidade é pequenininha; é a capital do pé de moleque - eu nem gosto muito de pé de moleque, mas é tão legal existir uma capital do pé de moleque! Sei lá, me afeiçoei... 
Depois me lembrei do poema transitório, de Mário Quintana... 

(...) Eu que nasci na Era da Fumaça: - trenzinho vagaroso com vagarosas paradas em cada estaçãozinha pobre para comprar pastéis pés-de-moleque sonhos - principalmente sonhos! (...)

E fui ver o que significa o nome "Piranguinho". É um nome que tem "pyrang", do Tupi, que significa "vermelho", com o diminutivo "inho", do português. Quer palavra mais bonita da lingua brasileira?


quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Estudos da linguagem



Estava eu fazendo uma limpeza no meu arquivo para dar mais espaço aos novos livros que chegaram e eis que encontro um pacotinho com todas as minhas avaliações da graduação!!! Provas de Introdução aos estudos da linguagem, fonética experimental, pragmática, teoria gramatical (com todas aquelas árvores sintáticas, uau!), fonologia, historia das ideias linguísticas, latim, grego, línguas indígenas, semântica, análise de discurso... É engraçado olhar para esses vestígios do que um dia eu aprendi; para esses papéis escritos, digitados, corrigidos, comentados... Quantas coisas eu já esqueci disso tudo! E quantas outras coisas permaneceram na memória e no coração... Olhando para uma prova de grego que fiz, fiquei admirada por não me lembrar de praticamente mais nada da língua - nem adianta me perguntar! - e, ao mesmo tempo, por guardar vários flashs das aulas, aqueles em que o professor contava histórias formidáveis que nos levavam a um outro nível de compreensão dos textos que estávamos lendo... Mistura de frustração, espanto e de uma felicidade estranha...

sexta-feira, 31 de julho de 2015

Me robaste un rincón de mi casa


Edición y montaje: Marcos Vinicius Texto y locución: Victoria Vilches Fotografías: Marcos Vinicius Canción: Erik Satie - Gnossienne No.1. 1889 Pinturas y Dibujos: Marcos Vinicius En orden alfabético: Amanecer en la habitación Amanecer en la habitación Bañera Nº3 El comedor de pataticas Parallel self-portrait Tres Victorias

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Um picnic perfeito em Paris...



Você está em Paris com o seu amor e nada poderia ser mais romântico do que um picnic na beira do Sena, n’est-ce pas? Então começam os preparativos: vocês compram um bom vinho français, uma baguette, uns queijinhos, damascos, pistaches e outros “apéros” para o jantar romântico. Mil e uma músicas francesas vêm na cabeça... a ideia de um vento fresquinho na beira do rio, a tranquilidade... o namoro... Não é isso que pensamos? Aquele momento de filme, tão sonhado e esperado, vai acontecer!!! Então dane-se que isto é um clichê... vamos aproveitar!!! Estamos nós, caminhando em direção ao rio, descendo as escadas... e eis que... 

... o perfume da realidade, aquele perfuminho peculiar dos cantinhos escuros das noites parisienses vai crescendo no descer os degraus que levam ao famoso rio... Tudo bem, vamos mais pra frente até encontrar um lugar sem esse cheiro de xixi? Vamos!!! Fomos. Um passinho, dois passinhos, três passinhos... e eis que...

Aahhhh!!!! Um raaaatooooo! Aaahhhh! Mais uuuum!!! 

Passado o susto inicial, os ratinhos e ratões não parecem assim tão assustadores, porque, afinal, estamos caminhando na beira do rio Sena, em Paris!!! Vamos encontrar um banco limpo e uma brisa respirável? Vamos!!! Fomos. Conseguimos um lugarzinho perfeito, com um banco, de frente para um bateau-bar lotado tocando o quê? Rock’ in roll... Mas o banco estava ótimo: limpinho, alto e perfeito para a Ana ficar com as pernas cruzadas sem perigo de tocar o chão dos amiguinhos roedores. Então tchau, músicas francesas da Edith Piaf, do Charles Aznavour, do Yves Montand e do Jacques Brel!!! Também gostamos de rock... 

Voilà uma "fotinha" de um ratinho super sympa!!! 



 

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Mais de Eduardo Galeano...

 
Los caminos del viento

Querido Stig:

Ojalá seamos dignos de tu desesperada esperanza.

Ojalá podamos tener el coraje de estar solos y la valentía de arriesgarnos a estar juntos, porque de nada sirve un diente fuera de la boca, ni un dedo fuera de la mano.

Ojalá podamos ser desobedientes cada
vez que recibimos órdenes que humillan nuestra conciencia o violan nuestro sentido común.

Ojalá podamos merecer que nos llamen locos, como han sido llamadas locas las Madres de Plaza de Mayo, por cometer la locura de negarnos a olvidar en los tiempos de la amnesia obligatoria.

Ojalá podamos ser tan porfiados para seguir creyendo, contra toda evidencia, que la condición humana vale la pena, porque hemos sido mal hechos, pero no estamos terminados.

Ojalá podamos ser capaces de seguir caminando los caminos del viento, a pesar de las caídas y las traiciones y las derrotas, porque la historia continúa, más allá de nosotros, y cuando ella dice adiós, está diciendo: hasta luego.

Ojalá podamos mantener viva la certeza de que es posible ser compatriota y contemporáneo de todo aquel que viva animado por la voluntad de justicia y la voluntad de belleza, nazca donde nazca y viva cuando viva, porque no tienen fronteras los mapas del alma ni del tiempo.

Eduardo Galeano - Palabras de agradecimiento al recibir el Premio Stig Dagerman.
 (Suecia, 12 de septiembre de 2010).


Retirado do blog: 
http://www.memoriadelfuego.org/2013/08/los-caminos-del-viento.html

terça-feira, 6 de agosto de 2013

por isso BEIJE-ME!!!


Finalmente fui a um show do Ney Matogrosso!!! 
E fui com o meu amor... 



 (Homenagem de Ney Matogrosso a Itamar Assumpção)

Rosas crisântemos cravos e jasmins
Brancas margaridas nos jardins
Borboletas mil cores nos polens das flores
Porém isso não vai ficar assim, meu bem
Isso não vai ficar assim 

Bichos bichas punk anjos querubins
Iansã deus tupã eu tudo enfim
Peter-Pan pó de pirlimpimpim
Também isso não vai ficar assim, meu bem
Isso não vai ficar assim
Por isso beije-me

Tudo se for bom nela se for ruim
Colibris carnavais vocais corais
Rês camponês vocês cobras e cupins
Porém isso não vai ficar assim, meu bem
Isso não vai ficar assim

Nossos filhos, nossas filhas
Vidas individuais mortais
Também nem mais do que seus pobres pais
Pintam bordam fazem quase tudo podem
Porém isso não vai ficar assim meu bem
Isso não vai ficar assim
Por isso beije-me
Como se fosse esta noite a última vez

domingo, 17 de março de 2013

microconto

Ela abriu o portão e saiu. Onde ele está? Ao voltar a cabeça para a esquerda, encontrou aqueles olhos azuis... que ela roubou para sempre...

domingo, 13 de janeiro de 2013

Do nunca que sempre dessa vida galhofeira

...uma divagação erótica e política



Algumas coisas, parece, nunca irão acontecer. Quanto a isso, só tenho tranquilidades.
O que me tira o chão é o que sempre nunca irá acontecer. O que poderia acontecer, mas não vai. Nunca. A cada vez. E sempre.


sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

listinha...


Coisas essenciais que preciso comprar ainda neste ano: 

* ingredientes de uma receita de doce, 
* gerânios para o meu jardim 
* e fitas de gorgurão para mim... 



domingo, 9 de dezembro de 2012

Casa de mel

IRARUCA* 

Destino é o nome que damos 
à nossa comodidade, 
à covardia do não-risco,
do não-pegar-as-coisas-com-os-dentes. 

Quanto a mim,
pátria é o que eu chamo poesia
e todas as sensualidades: vida. 
Amor é o que eu chamo mar,
é o que eu chamo água. 

*(do tupi): casa de mel.

Olga Savary

domingo, 18 de novembro de 2012

parafraseando Drummond...


Eu não devia dizer... 
mas essa sensação de que eu perdi algo
e que talvez passe logo... 
e essa música
e esse vinho... 
botam a gente comovida como o diabo!

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Simone de Beauvoir

« Vraiment, j'ai réussi ma vie, puisque j'ai réussi à peu près tous mes rêves. Simplement, il y a un moment où, quand on se retourne réflexivement sur sa vie, on s'aperçoit qu'une vie, même réussie, c'est sur un certain plan un échec, parce que ce n'est pas quelque chose, une vie, qu'on peut prendre dans ses mains, posséder, contempler : on n'a pas une vie, finalement. C'est exactement cela : les promesses ont été tenues mais, une promesse tenue, ce n'est pas ce qu'on se promettait, parce qu'on vise toujours l'être, l'absolu, et qu'on n'a jamais qu'une existence relative. Au fond, c'est très simple, je croyais, quand j'étais jeune, que j'avais une vie devant moi, mais une vie n'est jamais ni devant ni derrière, ce n'est pas quelque chose qu'on a, c'est quelque chose qui passe. » 

“Verdadeiramente, eu consegui me realizar em minha minha vida, porque eu consegui realizar quase todos os meus sonhos. Simplesmente, há um momento no qual, quando se retorna reflexivamente sobre sua vida, se percebe que uma vida, mesmo realizada, é sobre um certo plano uma derrota, porque a vida não é alguma coisa que se possa prender nas mãos, possuir, contemplar: não se tem uma vida, finalmente. É exatamente isso: as promessas foram feitas, mas uma promessa feita não é o que se prometeu, porque se visa sempre o ser, o absoluto e não temos jamais senão uma existência relativa. No fundo, é muito simples; eu acreditava, quando era jovem, que tinha uma vida diante de mim, mas uma vida não está jamais nem diante nem atrás, não é alguma coisa que se tem, é alguma coisa que passa.” 


sábado, 8 de setembro de 2012

da memória...


às vezes eu gosto de acender um cigarro só para ouvir o barulhinho da brasa queimando e ver a fumaça se desfazendo no ar, como o tempo... o tempo e a fumaça vão embora, enquanto a memória fica...




mas a memória também é brasa e fumaça, e também muda com o tempo... ela acende, queima e faz curvas... corre para um lado, depois voa para outro... ri, chora, sonha, apaga, esquece e depois acende de novo...

a memória imagina o que foi, e imagina diferente a cada vez... o passado da memória se contorna pelos acontecimentos do presente, se re-contorna de novas curvas, novas faíscas, novos sonhos, e retorna diferente... imaginação brinca com a memória, fumaça misteriosa, que se desfaz e refaz, indefinidamente...


domingo, 2 de setembro de 2012

e ...



As roseiras mais floridas, um botão de amarilis que surge feito mágica e três siriris que invadem este apartamento, mesmo com todas as janelas fechadas... Primavera!!!! Que gostoso te sentir chegando!!! Agora só falta você me dar: a cantoria das suas cigarras madrugadeiras, o ar cheio de umidade, e ... 


quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Vaidosíssima


"O principezinho, que assistia à instalação de um enorme botão, bem sentiu que sairia dali uma aparição miraculosa; mas a flor não acabava mais de preparar-se, de preparar sua beleza, no seu verde quarto. Escolhia as cores com cuidado. Vestia-se lentamente, ajustava uma a uma suas pétalas. Não queria sair, como os cravos, amarrotada. No radioso esplendor da sua beleza é que ela queria aparecer. Ah ! sim. Era vaidosa. Sua misteriosa toalete, portanto, durara dias e dias. 
E eis que uma bela manhã, justamente à hora do sol nascer, havia-se, afinal, mostrado. E ela, que se preparara com tanto esmero, disse, bocejando: 
 - Ah ! eu acabo de despertar. . . Desculpa... Estou ainda toda despenteada... 
O principezinho, então, não pôde conter o seu espanto: 
- Como és bonita! 
- Não é? respondeu a flor docemente. Nasci ao mesmo tempo que o sol... 
O principezinho percebeu logo que a flor não era modesta. Mas era tão comovente!" 

O Pequeno Príncipe - Antoine de Saint-Exupéry

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Nunca postei nada do Eduardo Galeano por aqui? Hora de começar... : )

La pálida 

Mis certezas desayunan dudas. Y hay días en que me siento extranjero en Montevideo y en cualquier otra parte. En esos días, días sin sol, noches sin luna, ningún lugar es mi lugar y no consigo reconocerme en nada, ni en nadie. Las palabras no se parecen a lo que nombran y ni siquiera se parecen a su propio sonido. Entonces no estoy donde estoy. Dejo mi cuerpo y me voy, lejos, a ninguna parte, y no quiero estar con nadie, ni siquiera conmigo, y no tengo, ni quiero tener, nombre ninguno: entonces pierdo las ganas de llamarme o ser llamado. 

Eduardo Galeano - El libro de los abrazos

terça-feira, 17 de julho de 2012

Uma verdade contraditória

Há coisas que não posso perdoar e nem esquecer. Mas uma coisa que consegui entender em mim é que, quando a falta é cometida por quem eu amo muito, o amor acaba sendo maior do que o não-perdão. 

Poder não perdoar – não perdoar mesmo! – e ainda assim amar – e amar demais! – é aceitar uma condição talvez contraditória, mas que é verdadeira em mim. 

Não quero ser o hipócrita que se policia para esconder a lembrança dolorida dos erros do outro quando ela vem à tona e nem o rancoroso que se veste com todas as armas para que impedir que o menor vestígio de amor se escancare no momento mais desprevenido. 

Eu decidi viver assim, sem apagar o que não pode ser apagado – o erro e o amor – porque todos erram e todos amam. E eu quero o não-perdão verdadeiro e o amor escancarado!

domingo, 1 de julho de 2012

Simples desejo

"que tal abrir a porta do dia
entrar sem pedir licença
sem parar pra pensar,
pensar em nada… 

legal ficar sorrindo à toa
sorrir pra qualquer pessoa 
andar sem rumo na rua" 



"eu não quero tudo de uma vez"... 
mas eu quero TU-DO!!! 

^_^

quarta-feira, 28 de março de 2012

these foolish things



A cigarette that bears a lipstick's traces,
An airline ticket to romantic places,
A fairgrounds painted swings,
These foolish things remind me of you.

A tinkling piano in the next apartment,
Those stumbling words that told you what my heart meant,
And still my heart has wings.
These foolish things remind me of you.
You came, you saw, you conquered me.

When you did that to me, I knew somehow
It had to be.

The winds of March that make my heart a dancer,
A telephone that rings but who's to answer.
Oh, how the thought of you clings.
These foolish things remind me of you.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Casamento de passarinho




uma pausa para ver
a tardinha
da minha janela
com nuvens cor-de-rosa
aviãozinho bimotor
helicóptero
carros, caminhões, carro de bombeiro
cachorros latindo em disputa
entre os muros de casas
e janelas de outros apartamentos

uma formiga passando por cima do papel
mosquitos, pessoas andando
tanto som de carro que até parece onda de mar

  mas obviamente
  eu prefiro onda de mar

a lua crescente
que já está lá no céu faz tempo
mas que só agora eu vi

quanto tempo você aguenta
Ana Cláudia
sem morrer de tédio
ou de saudade...

mosquitinhos pousando nas roseiras
dia fresquinho
de azul bonito
que é o azul da minha cidade

o bosque verde
o catavento em repouso
porque hoje resolveu não ter muito vento

uma brisa levíssima
e as andorinhas dando rasantes por aí

saudade das festas de casamento imaginárias
nos postes cheios de pardais

  aquele ali é o padre 
  aqueles dois mais pra lá são os noivos
  os convidados são os outros que estão mais pra lá ainda
  olha lá, vai dar briga
  
  qual é a noiva?
  
  é a que não tem barriguinha preta
  
  ah, tá bonito esse noivo
  de fraque e tudo

se não houvesse fios nos postes
não teria havido tanto casamento de passarinho